domingo, 29 de maio de 2011

Carlos Inevitável

Semelhante disperso
É sem vistagem no mundo.
Carlos Inevitável.

Das tentativas de auto-exílio.

Pois, nele debatiam-se inteiros:
Lajedo, trilogia, todos os conhecíveis...

Carlos Ímã
De existência fatal, irrestível.
Sua prisão era substancial:
tudo o que habita.

Sem feito fetiche/feitiço para si.

sábado, 21 de maio de 2011

Coisa não citadina

Ana destrambelhou-se no insólito congestionamento das quatro da tarde. Ela observava uma velha, toda aparecida, na garagem de sua casa. A senhorinha - de cabelos lisos, presos sem desvelo, vestida de azul e verde - varria sua calçada.
A imagem era estupefata: a senhora, rente à grade do portão, dispôs a vassoura e os braços, como objetos excomungados, para fora e varreu a calçada, cheia de movimentos truncados, por entre os vãos. Seu propósito não permeava nem metade do objetivo.
Era incrível e estarrecedor. Parecia mulher fugitiva do mundo, condenada pela própria casa, justa ao próprio corpo, escrava do processo da liberdade das leis machistas – ironia do próprio sistema – e da idade, esquecida até dos dialetos normais.
Ainda assim, foi possível reparar em seu último ato: a senhora empurrou o lixo recolhido para a calçada vizinha. O esforço, então, era de contaminar o alheio? Meio de inversão de seus hábitos domiciliares?
No cotidiano do dia seguinte, todavia, Ana não citou sujeira na garagem e no portão da velha, creu que ele dispersou-se, desde a tarde anterior, pelos destinos de outros crédulos e sãos do drama e da realidade.

domingo, 15 de maio de 2011

Ex amor

O ex-amor,
às vezes,
permite cateter e urbanismos...

Do ex-amor. O cultivo
partilha de alguma falta de consciência:
componente fetiche
das construções particulares.

A ausência do ex-amor
é recomendação não vivível, pedinte de palavras,
que vista,
se dilui
com sabor familiar.

sábado, 14 de maio de 2011

Tatuagem

Estava tatuado no interior de uma de suas coxas Travessia.
Seu sexo sinônimo.

Das descobertas

Em meio ao devaneio da cidade, uma criança, sem consciência do caminho e da importância do passo, caminhava com o pai. O fim era o ineditismo do hospital e das convenções do corpo.

Presentes no consultório, o menino esperava sua vez. As dores de cabeça eram insuportáveis, já na curta extensão de Idalício e, futuramente, maior seriam: a dor se alongaria por mais espaço. Todavia, essa já era preocupação secundária, o garoto se voltava, fazia semanas, à idéia que o atormentava: o eletroencefalograma. Ao questionar o pai, obteve a explicação de que o exame seria capaz de desenhar sua cabecinha por dentro e, assim, descobririam o porquê de tanta dor. Idalício entrou em estado de desespero, afinal, seria revelado tudo o que não se pode saber. Aos pais seriam revelados seus pecados!
Deitado na maca branca, fina e indiferente, seus seis anos não ocupavam muito espaço, ainda mais todo encolhido. A médica, talvez, de alguma forma, ausente, fixava de maneira quase simétrica os eletrodos e tudo já ficava com uma nova cor para Idalício - um verde pálido de quem talvez não enxerga. O menino, tenso, esperava pelo momento da mais alta desgraça: pior que a mão no formigueiro em dia de ano novo. Iriam descobrir da sua tentativa de fuga, suas descobertas do sexo. Mas que desespero, meu Deus! Desespero recoberto de coragem que o menino fazia de escudo, feito mocinho de 10 anos.

Durante o exame, silêncio absoluto.

Já de saída e de volta para casa, estranhamente nada se modificou: seus pais nem insinuaram de seus segredos. Mas o menino não se apaziguava, a angústia de estar preso àquele exame estranho, o atormentava. Até que os resultados chegaram e lhe foram mostrados apenas riscos que subiam e desciam e tudo lhe parecia muito estranho, seu por dentro era muito diferente, coisas que ele não sabia identificar. Aquilo o assustou mais do que se seus segredos fossem revelados, mas ainda preferiu que assim fosse. Tudo estava em paz novamente, já podia retornar à sua rotina de 10 horas.

Já de todo esforço, nada valeu: o exame não resultou em nada, nada foi detectado. Porém, Idalício se deu conta, já aos seus 6 anos, de que por dentro não se sabe tudo o que há e o que há de nós não se reflete em luzes e eletricidade.

domingo, 8 de maio de 2011

Mirar

Em meio ao escarcéu
da Mata de São Lobo,
um único menino
mirava a borboleta.


E ele a feriu
sem estilingue na mão.

Fragmento

Aquele pedaço teu
É o meu laço esquerdo
que mede passo
 - modo moço doente -
intenso de passado,
quando te arranco e rasgo.
Tu és meu
fora das horas definidas:
pedaço de março,
dobro de mim.
água que dói.