quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Quase setembro prosaico

É evidente que em setembro


Saiba lá Deus por que

A primavera permanece.


E ainda sabe lá Deus por que

Jardineiros trabalham com ferro

E festejam o ano novo.

Feito nossos setembros: nunca encontráveis juntos,

Mas, talvez, um tanto imaginativos singulares

Como os anos que chegam

Próximos dos Equinócios na praia.

Mas Seja lá o que for em Setembro é muito.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Meia voz rouca

Faz dias que ele não acorda bem - mesmo que haja sol – fica meio sentado à janela, esperando que algo aconteça: desfazendo-se do homem de ontem. Fred nunca permanece por muito tempo alguma coisa, porque o dia vem. Na noite anterior, por exemplo, com muito esforço, fora homem jovem, impassível e condenado. Mas logo pela manhã, ele foi perdendo corpo: detectando, gota em gota, partes dos anos, das poses, do toque, da tempestade.
Ele até já havia sido só dois. Contudo, momentaneamente, ele era um rapaz sentado à janela, esperando que algo acontecesse. Mas o acontecer é sempre externo. O acontecido em nós parece não se manifestar em nada evidente. Nem naquela dança flamenca ousada ou na noite em Zaragoza.
Porém, da vez em que esteve em longe, no outro lado do oceano, ele perdeu a chance de confessar: “Londres não é distinta de você.”

domingo, 7 de agosto de 2011

A oração da vontade

Eu conheço sobre uma mulher húngara. Ela mudou-se recentemente para um antigo edifício da Avenida Brigadeiro Luis Antônio, no centro da cidade. A europeia oriental pronuncia e entende bem o inglês, o português, além do húngaro: língua um tanto desmistificada por causa dessas tão obscuras coisas. Não teve filhos. Noivou por duas vezes e ela mesma desmanchou os dois laços. Assim, a maior companhia da estrangeira foi sua falecida mãe húngara. Com ela, preparava deliciosas receitas tradicionais daquele país amarelo.
E ambas - quando ainda unidas na vida, na meia solidão de algum apartamento de extensas janelas - gostavam de cozinhar doces. Mas o desejo pelas sobremesas era fatídico, causava angústia e discussões interiores, já que as duas mulheres dividiam além da origem, e também pela origem, a diabetes e não podiam esbanjar a existência. Contudo, nas tardes dos dias ímpares - afinal, em mês de 31 dias elas ganhavam uma tarde a mais - quando se reuniam para desfrutar de um curto pedaço de bolo e uma xícara de café amargo, sentadas uma frente à outra, quando já sentiam ainda mais vontade de comer, a mãe perguntava, não se contendo de imaginação:
- Qual é a sua vontade do bolo? Se pudesse comer mais, quanto comeria?
Na realidade, quase gritando, a mãe gostaria de dizer: Quanto comeria se não morresse?
Diante da questão tão conhecida, a filha, como sempre, abaixava o olhar até o bolo e elas ficavam por ali mais algum tempo, sem saber o que fazer com tanta vontade, em silêncio.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Resquício

Eu apenas posso
memorá-lo,
lembrá-lo,
cordá-lo
e ainda
rememorá-lo,
relembrá-lo
recordá-lo
com só um tiquinho de ação
em algum varal que amanhece.