quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Dia de feira

Era dia de feira. Nas quitandas e barracas do interior, era dia de comprar carne seca e caranguejo.
Acabou-se de saber da morte de Joana. A velha era vizinha da família da qual trata essa narrativa. Família de mãe, pai e muitos filhos, filhos que se espalhavam pelo quintal.
Joana acordou naquele sábado sem nem pensar como se sentia, porque não sentia nada e nem haveria solução se sentisse ou pensasse. O sol faz pouco nascera e ela sentou-se na cama e rezou comedidamente: agradeceu o dia e a passagem da noite. Fez seu café com leite e comeu um pedaço de bolo dormido e foi à feira: Joana vivia da pensão do marido. Era viúva também de ventre, ele morreu depois de seguidas tentativas. Era só. Na feira comprou pouco: camarão, carne seca, feijão e outros temperos, tudo em quantidade para uma semana. Chegando em casa, cansada, sentou-se na cozinha, dividiu os alimentos e escolheu o almoço: carne seca cozida e antes de comer, não se sabe como, morreu.
Aquela família descobriu a morte de Joana e sua carne e, sem argumentos à providência, milagraram. Então todos se reuniram na casa, dividindo, gratos, a carne cozida na panela de pressão. Mas uma das crianças daquela família, uma menina, Luiza, naquele mesmo dia, semelhou a obrigatoriedade com a morte, a menina comia obrigada a carne da morta. Ela sentia a morte em sua garganta. Neste instante, a fome era sua dignidade, salvação, imposição da sua vida. A fome era seu sinônimo de sobrevivência. Mas naquele dia, finalmente, tornando-se humanidade, ela nutriu a morte em si pela primeira vez.

Um comentário:

  1. E ainda você acha que iria conseguir fazer Relações Públicas... ai.. ai Juliane... faz assim: em fez de você fazer um cursinho pra vestibular faz um comigo pra passar num concurso público... ai nos viramos funcionárias públicas e você terá como investir na sua carreira de escritora ( a Ligia Fagundes Telles que tá falando aqui na revista que eu tô lendo)....

    ResponderExcluir