quarta-feira, 27 de julho de 2011

Intervalo

No mundo em que existem até remédios para as unhas crescerem há também um amor que quase se esquece ou se esconde.
Ele morreu.
Perguntavam-se por soluções que não existem. Ninguém questionava sobre seu último pensamento.
Contudo alguém, especialmente ela, uma antiga amiga, encontrou aquele amor. Estava escondido, não de propósito, mas foi sendo apertado até encontrar lugar atrás do fígado, talvez. Enquanto sua função real era ser mesa repleta de doces, chamando a atenção de qualquer imaginação.
Agora os doces, como já sem validade, irrigavam todo o corpo dela com um sabor irreconhecível. Aquele que sentimos uma única vez diversas vezes.
Existia, então, uma especiaria, uma culinária para cada amor?
E a amiga já não podia comer compulsivamente todas as guloseimas e se fartar de açúcar e companhia, o que havia guardado já era intocável em qualquer parte.
O último pensamento do morto foi, eu sei, como o de qualquer homem com alzheimer, esse pensamento que temos todos os dias: com a doença não se esquece só da vida, mas também da morte, vivemos em algum intervalo. Somos iguais em vida e morte.
Já a amiga, ela estava viva, e ao entrar no quarto e fechar a porta nada se modificou: continuava viva e dolorida. Não havia espaço, costume ou jardinagem. Era a vida e a morte. Nosso maior desespero. 

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